O amadorismo dos profissionais

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“Precisamos valorizar nossa profissão”, esse é um mantra que escuto desde o início da minha careira como músico. Já ouvi teorias variadas de como nós, a classe musical, podemos alcançar esse objetivo. Já escutei muitos colegas argumentarem em prol do tabelamento de preços, ou seja, criar um esquema onde todas as bandas da região cobrariam o mesmo valor mínimo para se apresentarem. Infelizmente os propositores desse plano nunca conseguiram explicar exatamente como ele seria implementado. Já escutei outros colegas defenderem saudosamente a volta da prática dos tempos em que a Ordem dos Músicos do Brasil fiscalizava os barzinhos e casas de show para saber se todos os artistas que lá se apresentavam eram credenciados pela mesma. Aparentemente isso valorizaria o trabalho dos “músicos de verdade”, em outras palavras, serviria como uma barreira de entrada ao mercado para os músicos que não possuíssem a tal da “carteira da OMB”. Já presenciei parceiros de banda dando chilique porque o dono do boteco se recusou a liberar uma porção de fritas com bacon. Enfim, são muitas as teorias de como melhorar as condições de trabalho do músico local, infelizmente a maioria das que já ouvi ou é composta por ideias mal pensadas ou não passa de retórica corporativista que só traria retrocesso.

Não me entenda mal, eu concordo plenamente que o trabalho do músico local é extremamente subvalorizado. Ser um músico “não famoso” no nosso país (e em muitos outros lugares do mundo) é uma grande demonstração de amor à arte, pois dá muito trabalho e o retorno geralmente não compensa o esforço. Dito isso, creio que as soluções geralmente apresentadas são em grande parte equivocadas. Para mim o caminho que realmente traz reconhecimento e respeito ao músico, é o caminho da profissionalização. Vixi, agora eu arrumei treta! Espera, deixe-me explicar: Muitos acreditam que ser um músico profissional está relacionado simplesmente a sua habilidade musical, ou seja, quanto melhor você domina seu instrumento, mais profissional você é. Isso é uma grande mentira! É lógico que ser um músico profissional envolve também a sua proficiência no seu instrumento, porém isso é somente uma das inúmeras qualidades que fazem um bom profissional da música. Ser um verdadeiro profissional musical significa, além de tocar bem, chegar na hora marcada, iniciar o show no horário combinado, trazer seu equipamento em boas condições (incluindo peças reserva caso haja alguma eventualidade), não se apresentar embriagado, ajudar ativamente na divulgação dos shows, ter mídias sociais que realmente sirvam como um canal de comunicação entre a banda e seu público, ter material de divulgação (logo, fotos, vídeos) disponível e com uma qualidade no mínimo razoável, estar bem ensaiado, etc. Nos meus anos de estrada conheci muita gente que eram invejáveis instrumentistas, mas que nunca chegaram a ser bons profissionais devido à falta de algumas das qualidades citadas.

Para finalizar, é sempre bom lembrar que assim como é o caso de qualquer outro mercado disputado majoritariamente por profissionais liberais, para uma banda se estabelecer, ser reconhecida e conquistar seu espaço (mesmo que na cena local) é preciso tempo e perseverança. Uma boa reputação profissional é construída ao longo dos anos e nada se concretiza do dia para a noite, mesmo que você seja o bruxão da guitarra que consegue tocar trocentas notas por segundo durante seus solos mirabolantes.